quarta-feira, 14 de novembro de 2018

A queda da Sears é bom ou mau negócio para os shopping centers?

Eles começaram vendendo basicamente um único produto, mas diante do conservadorismo do varejo e vislumbrando as oportunidades de mercado, em pouco tempo tornaram-se praticamente uma empresa que vendia de tudo. Com a vantagem de que os clientes podiam encomendar os produtos de qualquer lugar e recebê-los, em pouco tempo, na própria residência. Já poderosos, decidiram diversificar e começaram a operar lojas físicas, com sucesso. Como consequência, tornaram-se os maiores varejistas do mundo.
Você acha que eu estou falando da Amazon? Nada disso. Eu acabei de descrever parte da história da Sears, uma companhia centenária, que essa semana pediu concordata e pode estar vivendo seus últimos momentos.
Há cerca de 130 anos, Richard Sears, meio por acaso, começou a vender relógios e, em seguida, joias. Com esforço e dedicação, construiu um império baseado nas vendas por catálogo. Na década de 20, a Sears passou também a operar lojas. A expansão das lojas de departamento no mercado americano aconteceu principalmente no pós-guerra, ancorando os shopping centers nos subúrbios. Na década de 60, a Sears era considerada a maior empresa varejista do mundo. Em 1984, acredite, ela lançou o Prodigy, portal online pré-internet, que naquele tempo já oferecia e-mail, notícias, jogos e compras. No e-commerce a Sears entrou em 2000, apenas oito meses depois da Amazon.
Com tudo isso, como foi possível para a Sears chegar ao fundo do poço?
Em primeiro lugar, ela cometeu um erro comum entre os poderosos: confiou demais na própria força e acabou sofrendo a mesma consequência que havia imposto a muitos concorrentes nos tempos de glória: perdeu relevância. Seu pior algoz não foi o e-commerce, mas empresas como Best Buy, Home Depot, Lowe’s e, principalmente, Walmart. Na década de 90, ela ainda tentou reposicionar-se com uma campanha memorável para vender semi-duráveis: ‘Come to the soft side of Sears’ (em português algo como ‘venha para o lado mole da Sears’). A crise de 2008, porém, afetou violentamente a saúde da empresa, assim como toda a economia americana. A diferença é que a Sears nunca se recuperou dela. As tentativas para revitalizar uma marca tão forte não surtiram efeito e algumas decisões equivocadas acabaram levando a empresa a uma situação insustentável. As perdas apenas no ano passado chegaram a US$ 2,2 bilhões e a dívida total hoje passa de US$ 5 bilhões.
É natural que a mídia faça um paralelo entre a queda da Sears e o momento dos shopping centers nos Estados Unidos. Afinal, a marca ainda ancora muitos centros comerciais, embora seu poder de atrair clientes seja hoje apenas uma sombra do que foi no passado. Pode estar certo de que não faltarão matérias sobre o apocalipse do varejo e a morte dos shopping centers, requentadas a partir do gancho proporcionado pelo triste destino que parece aguardar a Sears.
De fato, alguns shoppings decadentes podem mesmo sofrer com mais esse enorme espaço vago no mall – vale lembrar que uma loja Sears ocupa em média 12 mil m2. No entanto, especialistas em real estate calculam que os alugueis que bons shoppings conseguirão cobrar de novos inquilinos com a satelização das lojas Sears podem até triplicar em comparação com o que é arrecadado agora. Isso sem falar nos ganhos com o aumento da atratividade que novas operações, mais ajustadas ao gosto dos consumidores, podem trazer para os empreendimentos.
Penso, no entanto, que a maior contribuição que a derrocada da Sears pode oferecer para a indústria de shopping centers, tanto a de lá quanto a de cá, será mostrar que a reinvenção deve ser permanente, que o sucesso de ontem não garante a sobrevivência no futuro, e que o varejo hoje é algo dramaticamente diferente do que foi no passado. Em outras palavras, o futuro é hoje à noite. Esteja preparado.

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